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terça-feira, 10 de dezembro de 2013

ULTIMO POST “MORANDO EM NANTES”




Este post ficou longo, hehehehhe (quantas vezes vocês já leram isso), mas é que dessa vez é especial, afinal é o fechamento de um ciclo.


Ele é tão especial que contará com trilha sonora. Vou postar duas músicas através de videos youtube. Eu os convido a escutá-las enquanto leem este texto. 



Há mais ou menos dois meses, eu penso neste post, o último “morando em Nantes”!!!
Pensava o que escreveria, se me focaria em agradecimentos, ou em pós e contras, ou em uma lista de coisas que vou sentir falta da França e das quais já sinto falta do Brasil ou quem sabe uma reflexão bem filosófica sobre o sentido da vida. Cada dia eu desenhava um post diferente na minha cabeça. Mas hoje (quarta-feira, 04 de dezembro), sentada no meu apartamento cada vez mais vazio, decidi fazer um misto de todas as ideias que tive no maior estilo “joga tudo dentro do liquidificador e vê no que dá!”

Como eu disse, o meu apartamento está cada dia mais vazio. Tenho pensando muito em um texto que li há muitos anos atrás e já reli ele nos últimos tempos várias vezes, inclusive já comentei sobre ele aqui. De autoria da Martha Medeiros, ela fala da fase em que morou no Chile e do seu retorno ao Brasil. Tenho me fixado muito em uma passagem no qual ela diz “estranhos entravam na minha casa e a iam deixando mais vazia e sem alma”. É a mais pura verdade. Não que eu tenha coisas muito valiosas na minha casa ou que eu seja hiper materialista, mas o conjunto desses objetos forma o teu lar e cada coisinha que sai é um pouco do quebra-cabeça que forma o teu home sweet home que se desfaz. 

Neste mesmo texto, mais para o final diz que hoje ela aprendeu a não se apegar às coisas materiais. Acho que isso virá para mim depois, quando eu formar novamente o meu lar.  Neste exato momento, no “olho do furacão” é complicado parar para pensar nisso.

São sentimentos contraditórios, você olha “TUDO” e “TUDO ISSO” deve desaparecer da sua casa em um dia e meio, mas, ao mesmo tempo, cada objeto que vai embora leva um pouco da nossa história.
Pra mim, até hoje o objeto mais difícil foi o berço do Artur. Quando ele passou pela porta de entrada do apartamento não pude mais olhá-lo, deu um nó na garganta... passou um filme na minha cabeça. Desde o dia que o escolhi com a minha amiga Andrea... depois todo o trabalho que eu e o Gustavo passamos para pintá-lo (4 demãos de tinta e lixadas entre elas), todas as tiradas de medidas e fotos para a minha sogra encomendar o protetor de berço. Depois,  o Artur se descobrindo nele, primeiro aprendendo a rolar, a surpresa a primeira vez que o encontrei em posição para engatinhar ou em pé na cama... 
Mas também, os objetos levam a tua história mas deixam um espaço em branco para que o novo seja desenhado.

Durante esse processo de mudança, ficou claro uma coisa que nos damos conta sempre e arranjamos uma desculpa para justificar, A ACUMULAÇÃO!! Nós chegamos aqui há 3 anos, com 4 malas e mais nada! Agora, estamos voltando com 7 caixas despachas por transporte aéreo (mais ou menos uns 150kgs), mais 6 malas de 32kgs com a gente. Fora tudo que já colocamos fora, demos ou vendemos.
A cada “canto” que eu vejo coisas acumuladas faço uma promessa, que no Brasil terei uma casa clean hehehe, mas não sei se conseguirei cumprir essa promessa, veremos
 
Nesse momento de transição, é impossível não se pegar fazendo um bilan, um balanço desses 3 anos.
E entre as várias vezes que eu refleti à respeito, eu me peguei classificando as minhas conclusões. Acho que é vício de blogeira. Achei tão interessante que resolvi compartilhar com vocês.
- O que aprendi na França sorrindo
* é possível estar em um engarrafamento sem precisar buzinar. As pessoas aqui não buzinam mesmo nos congestionamentos. É ótimo, porque buzina não faz o trânsito da hora de pico andar, me desculpe os adeptos dessa prática. 
* Que a gentileza no trânsito faz toda a diferença e NÃO DÓI RETRIBUIR!!!! Como é bom querer pegar uma auto-pista e saber que os outros motoristas vão te deixar entrar, ou quando se quer entrar em uma rua com fila de carros, sempre um motorista te dará passagem.
* Que não dói parar para pedestre nem respeitar ciclista. Também, que ciclistas e pedestres precisam ter noção de regras de trânsito. Realmente, como já dizia o Profeta Gentileza “Gentileza gera Gentileza”. Um dia eu sou pedestre, estou com o meu filho no carrinho e adoro todo mundo parando para atravessarmos a rua (sempre na faixa). Outro dia, sou motorista e paro para as pessoas que estão esperando para atravessar. Uma regra simples e eficaz.
* Que dar “Bom dia”, “Obrigada”, “Com licença”, “Por favor” não dói. Eu já era uma grande fã das palavrinhas mágicas no Brasil, mas aqui descobri que como é agradável ouvir isso sempre e ver que é quase uma “regra” social geral não escrita. 
*Que é possível sim ter um transporte público de qualidade. Mas isso demanda tempo e impenho governamental.
*Que é muito bom poder comprar um vinho de qualidade por uma média de 3 euros a garrafa. 
*Que a vida calma, em uma cidade intermediária é muito bom. A vida em Paris é sedutora mas hoje não trocaria a tranquilidade que tenho em Nantes pela Cidade Luz. 
*Ainda é possível confiar nas pessoas. Quantas vezes compre coisas de particulares pelos correios, no seguintes sistema: você envia o cheque, a pessoa recebe, desconta e envia a mercadoria.Funciona!! 

*Que existem mais queijos franceses do que juga a sua vã filosofia. Ahhhhh, os queijos franceses, já me fazem falta!!!!!!! 
*Que na França você NUNCA, eu disse NUNCA erra ao pedir uma sobremesa. Você pode fechar os olhos e fazer um sorteio às cegas na carte de desserte que você não vai errar.

- Coisas que eu aprendi chorando
* É muito ruim ser estrangeira. Por mais que você tente se adaptar, esteja com a mente aberta para a nova cultura, você sempre traz a sua bagagem, é inevitável. Você sempre tem um sotaque e a maioria dos seus diálogos são seguidos da pergunta “você é de onde?”. Se você é mal tratado em algum lugar, sempre fica a dúvida se a pessoa realmente não está de bom humor ou ela não gosta de estrangeiro. É um sentimento muito estranho. As vezes a impressão que dá que você está invadindo um espaço que não é seu.

*Que família faz falta. Simples assim.
*Que família, mesmo distante pode estar mais perto do que você imagina. Também, simples assim.

*Que você ama muito mais o seu país do que você imaginava.
*Que você é apegada a muito mais coisas do que você pensava.
*Que para o resto do mundo, inclusive Portugal, nós no Brasil falamos “brasileiro”. Isso quando não falamos espanhol.
*Que você é sempre mais forte do que imagina. Parece frase de facebook mas é verdade. Você está longe da família, sozinha, os problemas aparecem você tem que resolver e ponto. Não tem pra quem correr, não tem pra quem delegar é só você e você. No meu caso eu e meu marido que é a minha rocha!

- O que eu levo pra vida
*Que é muito bom poder voltar. Pode parecer bobagem, mas é muito bom ser de um país em que podemos voltar, que não vivemos uma guerra, temos oportunidades, a mulher tem seu espaço. Ai você vai dizer mas vivemos em uma guerra quando analisamos a violência ou a mulher ocupa cargos inferiores comparados ao homens. Sim sim, concordo!! Mas quando a gente mora fora e convive com pessoas de outros países a gente vê que tem muita sorte. Meu marido tem uma colega doutoranda que é da Líbia e ela não quer voltar para lá porque ela não pode trabalhar, só se o marido ou pai autorizar. O Egito, Tunisia, etc estão sempre com os ânimos elevados. Também, eu sou neta e bisneta de refugiados de guerra. A minha família materna é originária da Rússia, então eu cresci ouvindo histórias de sofrimento e dor da fuga, de ter que deixar uma vida toda pra trás, de se separar de familiares e nunca mais ter contato, da dor de ter que se adaptar a uma cultura por obrigação, a humilhação de ter que “mendigar” um país que os aceite, já que não são todos que aceitam refugiados... enfim, como já escreveu Milton Nascimento “Coisa que gosto é poder partir sem ter planos, melhor ainda é poder voltar quando eu quero”.

*Tudo deu certo. Como disse uma amiga minha, estamos voltando porque tudo deu certo e não porque ficamos sem emprego, ou não nos adaptamos ou tivemos problemas com a documentação. Foi tudo perfeito, dentro do esperado e inesperado, já que voltamos com a nossa maior jóia.
*Que virar a página não é fácil. Por mais que seja parte do ciclo dói porque precisamos deixar pra trás a nossa “zona de conforto”, o conhecido para migrar para o novo.

Eu escrevi este post em dois dias, comecei ele esvaziando o apartamento e terminei ele já com o apartamento entregue em um quarto de aparthotel. Foi difícil entregar o apartamento, entregar as chaves, ver a corretora fechar a porta do lugar que foi teu lar, teu porto seguro, foi a primeira casa que teu filho conheceu..... saí com um nó na garganta que continua, é impossível conter as lágrimas em certos momentos Eu quero voltar, estou feliz mas foram 3 anos, fiz amigos, criei uma rotina, me apaixonei pela cidade, me rendi à França.
Nantes sempre terá um espaço muito, mas muito especial no meu coração, nas minhas lembranças, na minha história. 

Última foto do Artur no nosso apartamento. Despedida. 

Tenho certeza que o Artur terá muito orgulho de ter nascido aqui. Mas também mais orgulho ainda de ser brasileiro!!!!

Bom, apesar de ser o meu último post morando em Nantes, eu continuarei com o blog. Tenho já dois posts alinhavados, um sobre Paris e outro sobre o que visitar em torno de Nantes. Também quero contar um pouco das minhas experiências desde aminha gravidez e parto até os trâmites administrativos para se acolher uma visita em casa. 
Também quero aos poucos ir comentando os lugares da França que conhecemos. Fiquem tranquilos, o blog continua. 

Allez!! On bouge!! Em route direction Brésil!!!! 
Vou contar com a ajuda de amigas queridas que ficaram em Nantes para me passar informações fresquinhas. 

"Deu pra ti, baixo astral vou pra Porto Alegre TCHAU!!"

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História de Nantes por fotos



 ... em 1940, o então comandante das forças de ocupação karl Hotz volta à Nantes. Ele foi assassinado no 20 de outubro de 1941, por 3 jovens resistentes vindos de Paris. Em represália, 48 reféns já presos por fazer resistência à ocupação, foram fusilados em Nantes, Paris e Châteaubriant.

Fonte das fotos:
Livro: Retour à Nantes
Autor: Daniel Quesney
Editora: Les Beux Jours
Foto: Cours de 50 Otages, place du Cirque - pg 118 e 119.







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